O Melhor Juiz do Mundo :: Por José Lima Santana
José Lima Santana*

O melhor juiz do mundo? Muita gente, ao redor do Globo terrestre, diria que sim. Frank Caprio. Nasceu e morreu em Providence, estado norte-americano de Rhode Island (23/11/36-20/08/25). Um ícone da magistratura. Faleceu aos 88 anos, derrubado por um câncer no pâncreas.
Caprio ficou famoso na internet com o programa "Caught In Providence", gravado em seu tribunal em Providence, Rhode Island, onde mostrava decisões judiciais marcadas por compaixão e bom humor.
Em algumas audiências, ele chamava crianças ao tribunal para ajudar a julgar os pais e chegou a cancelar multas de alunos do ensino médio, desde que prometessem seguir os estudos na faculdade.
Ora, Dr. Caprio, o senhor seria ojerizado por Hans Kelsen, para quem “direito é norma e norma é sanção”? Provavelmente, sim. A frieza da estrutura lógica da norma jurídica, como pensada pelo grande jurista austríaco, não se coadunaria com suas decisões, com o seu modo humano de sentenciar. O seu Tribunal não estaria sob as graças do pensamento dogmático, positivista mais arraigado, insensato. Mas, por certo, estaria de acordo com o pensamento dos juristas que tentam humanizar o Direito e a sua aplicação, como diria José de Oliveira Ascensão, em Lisboa: “O Direito é a solução prudente dentro da ordem”. A solução humanizada dentro dos parâmetros da ordem jurídica estabelecida.
Ninguém quer quebrar a estrutura da norma, a sentença aplicada caso a caso, para tirar da prisão quem deve ali pagar pelos seus erros. Todavia, ninguém também deve querer que as prisões continuem a se transformar em faculdades do crime, em depósitos de pessoas que cometeram erros e que devem ser condenadas a cumprir suas penas em locais insalubres e desumanizados.
Por outro lado, o Direito Penal não deve ser visto como o baluarte para fazer o devido controle social. O uso das normas jurídicas está muito além do Direito Penal. Este, como qualquer outro, é apenas um ramo da grande árvore jurídica.
“Dura lex, sed lex”. O velho brocardo romano ainda está em vigor. Não o desmereço. Também diziam os romanos que “as leis nos libertam, mas é debaixo delas que nós vivemos”. Muita gente, contudo, não pensa assim. Acha que a lei deve ser quebrada, deixada de lado, quando for para favorecer os seus quereres. Não! A lei precisa ser cultuada como meio de controle social, mas com a devida humanização, como o fez Frank Caprio em toda a sua vida de magistrado. E sabe-se que ele fez escola. Não deve ter feito muitos discípulos, entre magistrados em geral, pois ainda perdura no mundo judiciário a exaltação da norma e da sanção, nos moldes kelsenianos.
A grande vilania, por assim dizer, em torno da lei é quando cada pessoa ou grupo de pessoas almeja a aplicação da lei como melhor possa favorecer aos seus interesses. A mesma lei com aplicações diferentes. É o que estamos vendo, por exemplo, no Brasil de agora, polarizado por dois agrupamentos políticos. Cada lado invoca a lei ao seu bel prazer. É evidente que, por vezes, algumas decisões de juízes monocráticos ou de colegiados assustam um pouco. Ou muito. São, porém, exceções. Podem causar danos, é verdade, mas, ainda assim, são exceções.
O grande desafio dos magistrados é não se deixar contaminar pelo alarido vindo das ruas, especialmente de bocas sujas, que tentam ludibriar a sociedade, da qual são, inegavelmente, frutos. Uma pena!
Frank Caprio nos ensinou muito. Parece que pouco aprendemos com ele. No Instagram foi posta a seguinte mensagem após a notícia de sua morte: “Amado por sua compaixão, humildade e crença inabalável na bondade das pessoas, o juiz Caprio tocou a vida de milhões por meio de seu trabalho no tribunal e além dele. Seu carinho, bom humor e gentileza deixaram uma marca eterna em todos que o conheceram”.
Que ele continue a fazer escola. E o faça em muitos. Que a lei não sobreleve o Direito. E que este seja o veículo para a consecução da Justiça.