Contra a corrupção, contra o ridículo apelo ao retorno dos militares :: Por José Lima Santana
José Lima Santana(*) jlsantana@bol.com.br
Resumo do discurso que dirigi aos novos Bacharéis em Direito pela UFS, na sexta-feira, dia 24/04/2015.
Se nos dias atuais, não devemos querer um Estado em que a voz dos quartéis volte a nos comandar, porque essa voz soturna não representa a sociedade brasileira, também não devemos querer um Estado em que o poder seja partidariamente aparelhado e, com isso, abrindo-se o seio da Administração Pública aos raios negros da corrupção, onde quer que seja e por quem quer que a tenha praticado ou venha a praticar. Não são poucos os exemplos de atos de corrupção pelo país afora, longe ou perto de nós. E às vezes tão perto de nós. Em todos os casos, que a verdade brilhe translúcida e que a espada da Justiça faça equilibrar a balança, punindo os culpados de todos os partidos e de todas as esferas econômicas. Tudo isso em favor da sociedade à qual o Estado deve estar invariavelmente submisso.
A face negra da corrupção deve ser banida com firmeza pela mão da Justiça. E a face não menos negra da ditadura, que o povo baniu há 30 anos, mas que alguns pregam a sua volta, esta deve ficar para sempre soterrada em seus próprios porões. Uma e outra, corrupção e ditadura, têm o mesmo manto: o manto da sordidez e da indignidade.
Neste teatro, que tem o nome de Tobias Barreto, edificado para a realização de grandes espetáculos, vocês estão iniciando o maior espetáculo de suas vidas. Neste teatro consagrado à dramaturgia e à música, vocês começam a consagração de uma vida jurídica, que, tenho certeza, será, por cada um de vocês, limada na força do Direito e lapidada no esplendor da Justiça.
Vocês estão penetrando na vida jurídica, como profissionais, num momento ímpar da vida brasileira. Exatamente quando, mais uma vez, os pilares da ética desmoronam, mas, desta vez, provavelmente, como jamais desmoronaram antes. Quando as turbulências da corrupção mancham o chão sagrado da Pátria. Quando o sentimento de Pátria parece ter perdido completamente o seu sentido. Quando a descrença nos Poderes constituídos atinge um dos mais baixos níveis da história brasileira. Quando a face da deusa da Justiça, tão maculada pelo mundo afora e pelos tempos afora, parece crispada pela vergonha diante de tanta vilania e de tanta impunidade.
Este é o momento de vocês mostrarem que o Direito não deve se afastar de suas comportas, para que a injustiça não triunfe, para que a impunidade seja contida e dobrada, para que a liberdade continue a agitar a sua bandeira ao sabor dos ventos benfazejos, para que a paz não continue a ser ameaçada pelo esgarçamento do tecido social diante de, ainda, muitas diferenças, que distanciam uns brasileiros dos outros.
Este é o momento de vocês mostrarem que a ética em todos os quadrantes da vida brasileira precisa ser recomposta, para que muitos que se acham poderosos e imunes às rédeas da Constituição e das leis aprendam que o poder é do povo, e que isso não se afigure apenas como mera retórica constitucional, mas se imponha pelo zelo e pela altivez do nosso povo em lutar para a afirmação da dignidade da pessoa humana e pelo soerguimento da cidadania.
Este é o momento de vocês, a exemplo de Habermas, proclamarem que a ética refere-se ao bem que o indivíduo ou a comunidade deve cultivar, ao passo que a moral tem a ver com a justiça a ser praticada por todos.
Este é o momento de vocês exaltarem a liberdade em todas as suas expressões. Liberdade que possa propiciar a igualdade. Que faça triunfar os sentimentos de solidariedade e de justiça social. Uma liberdade que não se encolha, que não se acovarde. Que paire sobre tudo e sobre todos. Que se faça respeitar e que respeite. Liberdade que mostre caminhos, e não descaminhos. Que mostre a cada um os seus direitos e os seus deveres, enfim, os seus limites. E que vocês possam erguer a voz para cantar como Tobias Barreto cantou no poema ‘À Polônia’: “Só é grande a liberdade que sacode a majestade e arranca a juba dos reis!”.
A vida profissional lhes acena, lhes chama. Vão. Penetrem nela com a dignidade de quem anda com firmeza. Por vocês, velam os seus entes queridos. Por vocês, nós os seus professores torcemos sempre. Em vocês, em suas capacidades, nós os seus professores confiamos. Vão. Como águias, planem nas alturas do Direito. Como colibris, suguem o néctar das flores da Justiça, empreendendo o mais belo voo de suas vidas.
Continuem a ser aguerridos. Nada temam. Não vacilem. Não tremam jamais. Sejam destemidos. Sejam compreensivos. Sejam prudentes. Sejam arautos da paz e da liberdade. Sejam justos. Que a Justiça Suprema, a Justiça do Deus que se fez carne e habitou entre nós, seja o espelho da suprema justiça que vocês deverão praticar.
Continuem galgando degraus na escada da vida. Sem se rebaixar e sem se sobrepor a ninguém. Com os talentos que vocês têm. Lutem. Vençam. Abram portas. Abram as portas de seus corações. Deixem que neles penetre a sede de Justiça de muitos. Que neles continue penetrando o amor fraterno. Nunca esqueçam que vocês constituem uma família, ligada por laços de camaradagem nesses cinco anos de convivência. Vocês podem até esquecer os seus mestres, mas não esqueçam jamais aqueles que lhes deram a vida. Aqueles que sonham por vocês e com vocês. Aqueles cujos corações são a melhor morada que vocês poderão encontrar na vida. Tenham em seus pais um porto seguro, iluminado por estrelas. Em seus companheiros e companheiras, o aconchego de um ninho quando a tarde tomba no abismo da noite. Para os que, dentre vocês, são pais ou mães, vejam em seus filhinhos a mais bela flor desabrochada no mais belo dos jardins.
Vivam. Vivam abundantemente na luminosidade de seus atos. Lembrem-se destas palavras de Bertolt Brecht: “Todas as artes contribuem para a maior de todas as artes, a arte de viver”.
Que Deus derrame sobre suas já exitosas vidas a Luz que não se apaga.
Sejam vocês mesmo luzes. Luzes do Direito. Luzes da Justiça.
Enfim, sejam felizes.
(*) Advogado, professor da UFS, membro da ASL e do IHGSE
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