Diferença entre os sistemas de saúde dos EUA e do Brasil é destacada por estudante de Medicina durante internato
A disponibilidade de recursos e incentivos financeiros significativos para o desenvolvimento de pesquisas nos EUA, contrasta com a necessidade de um sistema de saúde universal semelhante ao do Brasil
Matheus Jhonnata Santos Mota, Aluno do 12º período de Medicina da Universidade Tiradentes - Foto: Acervo pessoal
Realizar um internato em outro país oferece uma oportunidade singular para estudantes de medicina, permitindo a expansão de conhecimentos tanto profissionais quanto pessoais. Matheus Jhonnata Santos Mota, aluno do 12º período de Medicina da Universidade Tiradentes (Unit), vivenciou essa experiência ao participar de um internato no Cambridge Health Alliance (CHA) em Boston, Estados Unidos, de 15 de abril a 10 de maio de 2024. Este estágio não só aprimorou suas habilidades médicas, mas também permitiu comparar os sistemas de saúde do Brasil e dos EUA.
"Tive a chance de conhecer todas as unidades do CHA e interagir com diversos médicos, desde a atenção primária até as especialidades em que atuei, como Oftalmologia e Urologia. Aprendi muito sobre o sistema de saúde dos EUA, que é bastante rígido e baseado em planos de saúde, mas também vi aspectos positivos. Massachusetts se destaca por receber muitos imigrantes e ter uma política de saúde mais inclusiva", destaca Matheus.
Matheus explica que o CHA é um hospital-escola associado à Harvard Medical School, atendendo pacientes de baixa e média renda. "A maioria dos pacientes que atendemos eram imigrantes, como brasileiros, haitianos, bengaleses e de outros países latinos. Todos têm direito a intérprete. Percebi que o sistema americano possui muitos recursos, novas medicações e pesquisas inovadoras, mas carece de um atendimento universal como o Sistema Único de Saúde (SUS)", relata.
Diferenças estruturais e operacionais
Durante o internato, Matheus observou particularidades operacionais e estruturais do sistema de saúde dos EUA. "Na atenção primária, atendi pacientes com alunos de medicina de Harvard, repassando os casos para médicos ou assistentes (PA), profissão inexistente no Brasil. Atuei em oftalmologia, urologia e cirurgia robótica. A estrutura conta com várias salas de atendimento e um pré-atendimento com PA. Um diferencial é o optometrista, que realiza exames de campo visual e refração, otimizando o tempo do oftalmologista, que atende cerca de 40 pacientes por dia", comenta.
No centro cirúrgico, Matheus notou a falta de anestesistas, com anestesias frequentemente realizadas por enfermeiros anestesistas, gerando ocasionalmente conflitos interpessoais. Ele também acompanhou intérpretes, profissionais dedicados a traduzir consultas e pré/pós-operatórios em qualquer especialidade. "Trabalhei com intérpretes de português e espanhol em consultas de psiquiatria e pós-operatórios de cesárea, o que ampliou meu vocabulário e ressaltou a importância de aprender outros idiomas, como espanhol e francês, devido ao atendimento a muitos haitianos. O contato com os médicos foi extremamente positivo; eles são muito receptivos com estudantes de medicina. A experiência superou todas as expectativas", revela.
Outro ponto destacado por Matheus é a disponibilidade de recursos e incentivos financeiros significativos para o desenvolvimento de pesquisas nos EUA, contrastando com a necessidade de um sistema de saúde universal semelhante ao do Brasil. "Essa experiência me fez valorizar ainda mais o sistema de saúde brasileiro e nossa formação profissional. Com o contato com os alunos da escola de medicina de Harvard, percebi que a formação médica no Brasil é mais dinâmica, menos rígida e mais inclusiva. Nos EUA, após o ensino médio, os estudantes fazem quatro anos de faculdade (em biologia, psicologia, etc.) e depois mais quatro anos de medicina. No Brasil, são seis anos de medicina diretamente após o ensino médio", observa.
Ele ressalta que, para ingressar em uma faculdade de medicina nos EUA, não basta estudar muito e ter recursos financeiros, pois as faculdades são muito mais caras. É necessário também se adequar ao perfil específico da instituição, o que torna o acesso à medicina no Brasil mais inclusivo. Outro ponto importante é o receio da judicialização que os profissionais de saúde nos EUA enfrentam. "A maioria dos pacientes lá são operados intubados e com anestesia geral, e não há muito espaço para empirismo na atenção primária. Acredito que, em relação à anestesia, o suporte no Brasil é diferenciado e eficaz", menciona.
Impacto pessoal, profissional e trajetória acadêmica
Desde o início da faculdade, Matheus almejava uma experiência internacional. "Como eu não sabia espanhol e tinha apenas uma base escolar de inglês, sabia que precisaria melhorar meu inglês para aproveitar a oportunidade. Fiz o nivelamento no Unit Idiomas, começando no nível 6 e estudando para alcançar o nível 10 e a proficiência. Embora tenha pausado os estudos por um tempo, participar do Programa Mentoria me ajudou a continuar, com um incentivo de 60% de desconto", relembra.
Essa preparação resultou em estágios concorridos, como na Cardiologia do Hospital do Coração e na Clínica Médica do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (HAOC), em São Paulo. "No segundo período, ao competir por monitoria com internos mais experientes, percebi a necessidade de ter um currículo competitivo. Participei de pesquisas, centro acadêmico, ligas, iniciação científica, monitoria e estágios extracurriculares. Na fase final da faculdade, intensifiquei meu contato com pesquisa e passei a estudar artigos em inglês sem tradução, o que melhorou meu aprendizado e aproveitamento do estágio em Boston", aponta Matheus.
A experiência em Boston impactou profundamente a visão de Matheus sobre a prática médica e sua formação. "Profissionalmente, estou mais motivado para aprender tecnologias avançadas e lidar com equipes multidisciplinares. Pessoalmente, a experiência reforçou meu compromisso com a humanização do atendimento médico e a aprendizagem contínua de novos idiomas e culturas", afirma.
Matheus recomenda a experiência de internato internacional para outros estudantes. "Recomendo demais essa experiência. É uma oportunidade de vivenciar diferentes sistemas de saúde, trabalhar com diversas especialidades e profissionais, aprender novos idiomas e culturas, e se motivar para inovação e pesquisa. É uma experiência de vida que todos os alunos deveriam ter", finaliza.