Associação Ordem e Progresso: o presidente cai ou não cai? :: Por José Lima Santana
José Lima Santana* - jlsantana@bol.com.br
José Lima Santana (Foto: Arquivo Pessoal)
A cidade ficou dividida. Os mais pobres, mas, não só estes, ficaram ao lado de Zenilma. Os mais ricos e os mais ou menos ficaram, em maioria, ao lado de Décio Mineiro. Nas discussões em bares e esquinas, a divisão mostrava-se presente. Na esquina do diabo, confluência das Ruas do Cavaco e do Embeleco, formou-se uma roda de alentada discussão, numa noite de sexta-feira. Bem em frente ao sobrado da vitalina Cícera de João Pinheiro. A velhota botou os faladores para correr, despejando sobre eles um penico de mijo da noite anterior, que ainda estava no bidê do quarto. Imaginem o “cheiro”.
Ora, no decorrer do mandato, Zenilma destrambelhou-se. Adepta de boas pedaladas, ela acabaria caindo da bicicleta numa noite escura. Coitada! O tombo foi tão infeliz que a tirou de circulação. Embora acidentada e de forma grave, com a coluna vertebral seriamente avariada, e sem poder cumprir com as funções inerentes à presidência da Associação, ela insistia em ficar à frente dos negócios. À surdina, Marcelino tramava para o afastamento da presidenta. O Conselho Deliberativo da Associação Ordem e Progresso abriu um procedimento contra Zenilma. E depois de idas e vindas, de muito falar e de muitas tramas, eis que Zenilma caiu. Mancomunados, Marcelino e membros do Conselho vibraram. Marcelino passou a ser o presidente. As más línguas dos puxa sacos de Zenilma apelidaram-no de Mordomo de Drácula. E os adeptos destes apelidaram Zenilma de Bucha de Canhão. Nos dois casos, não sei por quê.
Nas mãos de Marcelino, a Associação Ordem e Progresso não andou um palmo. Continuou se arrastando como vinha há algum tempo. Os associados chiavam, mas Marcelino fazia vistas grossas. De chofre, surgiram denúncias contra o presidente Marcelino. Denúncias graves. Aliás, gravíssimas. Os membros da Associação e toda a cidade arrepiaram-se. As mídias soltaram os cachorros contra Marcelino. E as mídias daquele tempo eram os pasquins que ocasionalmente e à surdina eram afixados na porta central da igreja matriz. Marcelino ficou encurralado como se numa gangorra estivesse. Cai não cai.
A cidade sofria. A divisão das pessoas em dois blocos antagônicos, apelidados de coxinhas e mortadelas causava confrontos e aborrecimentos. Os ícones de cada bloco estavam enfiados na lama até o cocuruto da cabeça, mas os seus cupinchas os defendiam. Marcelino, Zenilma e Décio, além de muitos outros membros da Associação Ordem e Progresso, como o ex-presidente da Associação, tentavam sobreviver às duras penas. Uma camarilha se espalhara sobre a cidade. Vergonhosamente. Estupidamente. Cada um dos implicados nas mais diversas e graves denúncias deveria comprar para si um frasco de óleo de peroba para lubrificar a própria cara desavergonhada.
No beco do fedor, lugarzinho miserável onde eram jogadas muitas imundícies e onde sujeitos promíscuos obravam à vontade, um sujeito gozador, Manelito de Justino Boca Preta, tipo de poeta popular debochado, escreveu numa faixa de pano: “O mundo está perdido / Tudo está esculhambado / O povo foi iludido / Mas o troco há de ser dado”.
Passando pelo beco, Julinha Língua Bendita exclamou: “Que merda! É bosta pra todo lado”. Coitada, sem querer, atolara-se na fedentina. E era assim mesmo como se sentia o povo da cidade. Atolado. Por causa das porcarias que as pessoas da Associação Ordem e Progresso fizeram. Tais porcarias emporcalhavam a cidade e respingava no povo. O povo, por sua vez, embora lascado, dividido em coxinhas e mortadelas, não se unia. Uns, nas janelas, batiam panelas; outros berravam nas ruas. Sem a união do povo, os polvos estendiam os seus tentáculos lamacentos sobre a cidade. Quem os deteria? Um tribunal? Qual? Nenhum, talvez O povo criou-os. Embora eles se deformassem no decurso do tempo. Somente o povo, unido, um dia, sabe-se lá quando, os baniria da Associação Ordem e Progresso.
Marcelino cairia? As lagartixas de parede haveriam de sustentá-lo? Vitória popular ou vergonha coletiva?
Povo nenhum merecia gente do tipo daqueles miseráveis que tomaram de assalto a Associação Ordem e Progresso. Nem daqueles que da Associação queriam se apoderar. Eram, todos, farinha do mesmo saco. Uma cambada só.
Que Deus velasse pelo povo.
*PADRE. ADVOGADO. PROFESSOR DA UFS. MEMBRO DA ASL DA ASLJ E DO IHGSE
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