Aracaju (SE), 23 de novembro de 2024
POR: (*) José Lima Santana - jlsantana@bol.com.br
Fonte: José Lima Santana
Pub.: 22 de março de 2015

O grito das ruas: democracia ou ditadura? :: Por José Lima Santana

Nos últimos dias, diante da reação de parte da população brasileira a atos do governo federal, que, por exemplo, aumentaram tarifas públicas, majoraram tributos e empreenderam cortes no custeio da máquina pública e, também, no financiamento a estudantes universitários, embora, sob a ótica estrábica de alguns, que pregam o impeachment de Dona Dilma, sem, ainda, um fundamento jurídico que o sustente, os defensores do petismo voltaram à carga de sempre, para mostrar de forma equivocada que o levante contra o governo vem apenas das elites. Ora, que coisa mais banal! Então os 48,36% (quarenta e nove por cento) dos votos dados a Aécio Neves vieram das elites? Como são volumosas as elites brasileiras, hein? Conversa para boi dormir.

O grito das ruas: democracia ou ditadura? :: Por José Lima Santana - Foto: Arquivo pessoal

O grito das ruas: democracia ou ditadura? :: Por José Lima Santana - Foto: Arquivo pessoal


Os eleitores que não votaram no PT, nas quatro últimas eleições, são muitos e não se situam, socialmente e economicamente, apenas nas elites. Numericamente, as elites são pequenas. A classe média, baixa e alta, é bem mais volumosa. E mesmo parte desta vota no petismo. Ou seja, nem todo mundo que vota no PT é de classe baixa. E nem todo mundo dessa classe vota no PT. Não! E nem todo mundo que vota no PT é petista. E os votos dos partidos aliados? Quantos são esses votos?
 
Quando, segundo foi divulgado na imprensa, o líder maior do petismo, Lula, sugere que o “exército” do Stédile (do MST) poderá ser chamado para enfrentar os manifestantes contra o governo, e alguns alarmistas, ou não, da direita, incluindo militares de pijama, apregoam que esse tal “exército” não estaria armado apenas com foices e facões, e, inclusive, contaria com líderes muito bem treinados em ações de guerrilha, tanto na Colômbia, quanto em Cuba, a situação não é boa. Não é sequer razoável. Ao contrário, é absolutamente perigosa. E inaceitável. Pelo que eu sei, o Brasil tem apenas um exército: o Exército Brasileiro, uma das três Armas, que compõem a Segurança Externa nacional, que nos deve garantir a manutenção da soberania. E será muito bom que o Exército e as outras duas Armas, Marinha e Aeronáutica, fiquem onde estão, ou seja, nas casernas, que são os seus lugares de origem, como determina a Constituição Federal. Que os militares se mantenham longe, muito longe, da vida política. Como já se disse noutras plagas, afinal, “o soldado não é a cabeça da Pátria, mas apenas o seu braço”. E que nunca mais passe disso. Jamais!
 
Por outro lado, não se pode conceber um terceiro turno das eleições de outubro último. Contudo, a alegação desse suposto terceiro turno é o modo usado pelo petismo para contestar os movimentos que se antepõem aos atos governamentais que fazem sangrar mais ainda os bolsos dos brasileiros. Em qualquer democracia, é amplamente admissível os protestos contra os governantes e as manifestações de apoio aos mesmos. Sabemos muito bem que “a praça é do povo, como o céu é do condor”. Que as manifestações contra ou pro, quando for preciso, possam continuar ocorrendo, em paz. Contra a corrupção. Contra a impunidade. Contra atos governamentais que ferem o bolso da população. A favor da reforma política, esta discutida com a sociedade e não imposta de goela abaixo, como alguns esperam fazê-lo. Tomara que não.
 
Vamos a outro aspecto. É provável que nunca se tenha visto no Brasil, tão desencontradas informações numéricas quanto as que se referiram aos quantitativos de participantes nos movimentos de apoio ao governo de Dona Dilma, no último dia 13, sexta-feira. Os organizadores espicharam os números o quanto puderam. As Polícias deram números mais modestos. Do mesmo modo, são desencontradas as estimativas das manifestações deste domingo, dia 15. No entanto, o que se viu foi um número infinitamente maior do que o do dia 13. Sem falar que as convocações para o apoio ao governo saíram de entidades sindicais e outras, devidamente atreladas ao petismo. As convocações para o dia 15 vieram das redes sociais. No dia 13, a vestimenta nas ruas foi vermelha. No dia 15, ela foi verde-amarela.
 
Uma questão que deve ser sempre lembrada: nas duas eleições de FHC, ele as venceu no primeiro turno. Numa cacetada só. Infelizmente, para mim, que nunca votei nele, embora não o menospreze como homem público. Porém, ele teve uma oposição danada de bem constituída. Oposição dura. Quem não lembra, por exemplo, os muros pichados em todo o país com a expressão “Fora FHC!”, logo após a sua reeleição? Quem poderá esquecer as oratórias afiadas no Senado e na Câmara contra as medidas administrativas dos tucanos? Aqui, entre nós sergipanos, basta lembrar as boas performances de Zé Eduardo, no Senado, e Marcelo Déda, na Câmara, que obtiveram destaque nacional. Nas duas eleições de Lula e nas duas de Dona Dilma, as respectivas vitórias só vieram no segundo turno. E, até agora, a oposição ao PT tem sido mofina. Eu até diria, chocha. Os tucanos e os quase mortos-vivos demistas (o partido, que, como PFL, já foi grande e ruidoso, especialmente no Nordeste, como DEM está minguando e tende a sumir do mapa) ainda não aprenderam a fazer oposição, como a que o PT fez. Não souberam, e, talvez, nunca venham saber representar os anseios dos seus eleitores. Os partidos de oposição ao governo federal estão dissociados da parcela do povo brasileiro que eles representam, ou deveriam representar. Das urnas, em outubro passado, emergiram 51.041.155 eleitores contrários ao petismo. Foram 48,36% dos votos válidos. Não é pouca coisa.

Cinquenta e um milhões de eleitores, somados, provavelmente, a alguns que não foram às urnas, que votaram em branco ou anularam o voto, e, ainda, a alguns possíveis descontentes dentre os não petistas que votaram em Dona Dilma, e que supostamente se sentem enganados, formam um contingente formidável de eleitores que se põem contra as austeras medidas governamentais, contra a corrupção etc. O que é que há de errado nisso? Numa ditadura, tudo. Numa democracia, absolutamente nada. Enfim, o que é nós temos? Democracia ou ditadura? Toda manifestação pacífica contra ou a favor de qualquer governo há de ser sempre bem-vinda. Goste ou não, um ou outro lado. Tem gente que adora a democracia, mas só no gogó. Falar é fácil.
 
O governo enfrenta dificuldades políticas e administrativas. O Congresso Nacional que o diga. Administradores públicos federais que estão na ponta, nos órgãos públicos e nas entidades administrativas, sem pagar todas as contas em dia, que o digam. Os consumidores em geral que o digam. O que o governo tem que fazer é acertar o passo. O passo político e o passo administrativo. Se há manifestações contrárias ao governo, é porque há descompassos. Não é questão de terceiro turno.

Findas as manifestações contra o governo, os ministros José Eduardo Cardoso, da Justiça, e Miguel Rossetto, da Secretaria da Presidência, concederam uma entrevista coletiva. Muito pouco eles disseram além do que o governo sempre disse. No começo, Eduardo ainda tentou mostrar certo reconhecimento à voz das ruas, mas Rossetto mostrou-se sempre rançoso. O ranço de sempre do governo. E aí, no meio da entrevista, o panelaço voltou em algumas cidades. Numa democracia, o grito do povo, mesmo de eleitores contrários, deve ser ouvido. Numa ditadura, esse grito não passa de sussurro aos ouvidos moucos dos ditadores. O Brasil ainda é uma democracia. E que assim continue pelos tempos afora. O governo, repito, precisa acertar o passo. Se quiser ter paz. Neste domingo, o governo dormirá sob o efeito de remédios. Com certeza.

(*) Advogado, professor da UFS, membro da ASL e do IHGSE

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