O carnaval de Estância é mais uma vez cultural... Como deve ser
O carnaval de Estância é mais uma vez cultural? Como deve ser (Foto: Acorda Meu Povo)
Mas, Estância tem mais destaques culturais, a exemplo do pioneirismo na rádio difusão no Estado e sua emissora mais antiga, a rádio Esperança AM, completará no próximo dia 01 de maio 50 anos no ar, com uma programação prioritariamente pautada na informação cultural. A cidade tem mais 03 emissoras, duas FMs e outra AM.
Outro grande destaque é a centenária filarmônica Lira Carlos, ela é a banda e escola musical mais antiga de Sergipe, com seus 137 anos de atividades ininterruptas. De lá já saíram dezenas de músicos, para comporem grupos musicais em todo o Brasil, profissão iniciada na escola da Lira. Até hoje, várias crianças e adolescentes aprendem música e fazem parte dos concertos da Lira.
O São João pirotécnico de Estância, com seus maravilhosos Barcos de Fogo e suas Batucadas, são manifestações culturais únicas no mundo inteiro. E ainda se juntam, os inigualáveis licores caseiros e as deliciosas comidas típicas do ciclo junino. A festa dura 0s trinta dias do mês de junho, iniciada com a “Salva”, tradicionalmente realizada no dia 31 de maio.
Também no período do carnaval, Estância se destaca e se agiganta. É a única cidade do estado que realiza o desfile de Escolas de Samba. Tradição iniciada a mais de 60 anos, quando a Mangueira foi para as ruas da cidade mostrar o samba no pé e nunca mais parou. Depois dela, outras escolas surgiram e fizeram crescer ainda mais o nosso carnaval.
A partir da Mangueira, o carnaval do município criou essa característica, que manteve por muitos anos: Desfile de Escolas de Samba no domingo e na terça feira e as dezenas de Blocos Carnavalescos, igualmente tradicionais, percorrendo as ruas do centro e dos bairros, todos os dias, no período de Momo.
No entanto, no meio da década de 90, o poder público municipal(principal patrocinador e organizador), canalizou recursos e energias na realização do carnaval dos trios elétricos e shows com bandas, em um novo cenário, na praia do Abaís. Estava criado o new carnaval estanciano…feito por artistas de fora e fora do perímetro urbano. O litoral ganhou uma festa de peso que atraiu milhares de pessoas às nossas praias e a cidade, a cultura e seus brincantes perderam o carnaval de rua. Era a modernidade chegando, diziam uns e os outros…calaram.
Mas, em 2005, o governo municipal voltou a investir no resgate do carnaval cultural estanciano e como pioneira que sempre foi, a Mangueira voltou às ruas, bela, garbosa, alegre e vigorosa, como se nunca tivesse deixado a avenida. Os blocos tradicionais também voltaram e outros novos surgiram.
A partir daí, a escola Amantes do Samba, que tinha mais de trinta anos de tradição, também voltou à a avenida e nos anos que se seguiram, nasceram a Amantes da Paz, do bairro Cidade Nova, depois veio a Acadêmicos do Porto, a Império do Samba e a Imperatriz da Cidade. Felizmente, o carnaval cultural estava de volta e a cada ano conquistava mais passistas e despertava o interesse da imprensa estadual e dos turistas.
É importante frisar que esse carnaval resgatado, conviveu harmonicamente com o carnaval da praia e também na cidade, foram incluídos shows com bandas e trios elétricos…a tradição estava resgatada e a “modernidade”estava garantida. Afinal de contas, a cultura é dinâmica e cabe a todos o direito de experimentar outras formas de vivenciar a cultura, mas, preservando a tradição, a raiz, a essência cultural do povo.
Em 2016, a crise levou nosso carnaval a uma situação de quase não acontecer. Foi preciso que ajudas financeiras pessoais e de empresários garantissem o mínimo possível para que as escolas desfilassem…e elas desfilaram com garra e fizeram bonito, mais uma vez. Os blocos foram sacrificados, pois sem recursos, poucos voltaram às ruas.
Esse ano, a expectativa do resgate de um grandioso carnaval de rua, com desfiles de Escolas de Samba, com shows de bandas e outras ações grandiosas(como foi prometido em campanha), esbarrou na mesma crise, que ainda insiste e persiste em travar nossos municípios e a prefeitura, por contenção financeira, optou em realizar minimamente, o carnaval cultural.
Na minha opinião de militante cultural(que desde o fim da década de 70 continuo acreditando na cultura popular), creio ter sido essa, a melhor decisão. Digo mais, deveria ser essa, uma decisão ideológica de governo e não meramente de economia financeira.
O carnaval, assim como todas as festas populares, tem como característica a pureza do brincar, do confraternizar, do improvisar, de fazer a catarse humana exteriorizando os sentimentos da alma e não do bolso, muito menos do bolso de empresários e artistas de fora.
Precisamos aprender a admirar, respeitar e gostar dos nossos artistas, que são tão talentosos quanto os que vem de outras terras e só não vemos isso, por causo do nosso “complexo de colonizado”(só é bom e belo, o que vem de fora), outros chamam de “complexo de vira-latas”. Tenho consciência, de que nunca seremos nada, quanto povo, enquanto não acreditarmos, respeitarmos e valorizarmos o nosso próprio potencial artístico e cultural.
Os pernambucanos fizeram isso e o frevo hoje, é um ritmo conhecido e respeitado mundialmente. O carnaval de Olinda recebe turistas do mundo inteiro e é embalado por bandinhas de frevo e sem eletrificação do som. E tudo mundo enlouquece de felicidade e acontece até na quarta feira de cinzas, com o Bacalhau do Batata.
O povo de Parantins, no Amazonas, acreditou em seu potencial e transformou a festa dos bois Garantido e Caprichoso em um vento mundial, transmitido inclusive ao vivo, por uma grande rede de televisão. Os grandes artistas dessa festa, são os nativos da cidade.
Os baianos cansaram de serem representados apenas por suas grandes estrelas da MPB, como Caetano, Bethânia, Gil e Gal Costa, e decidiram acreditar que sua música, o Axé, era o melhor ritmo do Brasil e com isso, exportaram os blocos com cordas, abadás e trios elétricos, para fazerem festa em todo o país.
Aracaju realizou o Pré Caju por mais de 20 anos. Tobias Barreto usou como padrão para seu carnaval fora de época e até Estância, importou o modelo para o nosso tradicional São João.
Estive em São Luiz, no Maranhão e descobri com muita alegria que a grande festa junina da cidade, é feita com a apresentação de centenas de Bois(grupos folclóricos), que ocupam as praças em palcos e tablados, para o delírio e fascínio de milhares de turistas do Brasil e do mundo, que se acotovelam para assistirem àqueles grandes artistas, adornados com muitas penas e imensos chapéus…nativos da cidade.
Esses são alguns exemplos de que quando um povo acredita na sua identidade cultural e artística, ele convence o mundo do seu talento e desperta o interesse e a admiração de todos.
Portanto, nada mais natural na cidade Berço da Cultura, que seu carnaval seja cultural, e que isso seja por respeito ao nosso talento, por investimento em nossos artistas, por realizar um projeto de valoração dos nossos bens culturais e pela defesa, sedimentação e difusão da nossa arte e da nossa cultura, buscando elevar nossa auto estima e garantindo nosso lugar de destaque na produção dos nosso valores.
O bloco Deu a Louca nos Músicos, nesse domingo que passou, mostrou a beleza, a alegria, a criatividade e toda a força da essência cultural e artística da nossa gente e do grande orgulho de ser estanciano, brincando o mais belo carnaval cultural de Sergipe.