Aracaju (SE), 02 de novembro de 2024
POR: Fátima Almeida airam22_fafa@hotmail.com
Fonte: Fátima Almeida
Pub.: 22 de agosto de 2015

Mitos Folclóricos e Assombrações (III) :: Por Fátima Almeida

Fátima Almeida  airam22_fafa@hotmail.com

As minhas férias em Ventura sempre foram muito agradáveis. Apesar de não ter shoppings ou coisas do gênero, muito me agradava o convívio com a natureza.

Mitos Folclricos e Assombraes (III) :: Por Ftima Almeida - Imagens web/montagem by fafah - Sussuarana

Mitos Folclricos e Assombraes (III) :: Por Ftima Almeida - Imagens web/montagem by fafah - Sussuarana

Numa dessas férias, resolvi dar uns passeios a cavalo. O problema era que só tínhamos um  já velho e era poupado para emergências. O trabalho mais pesado ficava por conta de uma mula, jovem, saudável e tão forte quanto o seu temperamento. Quando cismava, destruía a cerca e nada a segurava. Com essa, a gente não podia contar. Restava então o pobre cavalo ruço, mas papai sempre recusava o consentimento, com uma exclamação “coitado do pobrezinho, vamos deixá-lo em paz!”. Difícil era me convencer a desistir de alguma coisa e num certo domingo à tarde, o encontramos selado na porta, e o melhor, sozinho. Coitado, tinha acabado de cumprir uma emergência – foi em uma fazenda próxima, comprar carne, porque por algum motivo não “teve boi” naquela semana, em Ventura. Às vezes acontecia do marchante, Compadre Tranquilino, não encontrar o animal para abate. O animal estava cansado e eu na ânsia de cavalgar sequer observei isso. Aproveitando aquele momento, chamei a minha amiga Angélica e tocamos para a estrada.

Ao sair de casa, deixamos no armazém esperando um medicamento para asma, uma mulher muito magra e doente. Depois de cavalgarmos uns dois quilômetros, próximo à uma curva, o cavalo refugou. Suspeitamos que fosse cobra. Dizem que os cavalos não pisam em rastros de cobras. Voltamos alguns metros e inconformadas, decidimos insistir. Passamos do local e logo após a curva ele quase nos derruba, empinou, relinchou, apavorado. Quando olhamos à nossa frente, estava a mulher que tínhamos deixado no armazém. Um misto de surpresa e pavor se apoderou de nós. Como ela teria chegado ali tão rápido? Se não saímos da estrada e não a vimos passar, como estava à nossa frente? Por que o cavalo se assustou? Chegamos em casa sem fôlego. Na calçada, algumas pessoas trocavam ideias e quando narramos o acontecido, sorriram. Segundo eles, a dita mulher tinha poderes sobrenaturais. “Ela passou invurtada, por vamecês!”, “Ela sabe as reza de São Cipriano!”, “Só o animal viu ela, por isso rifugou!”  Claro que eu já tinha ouvido falar sobre isso, mas nunca levei a sério! Nunca até aquele fatídico dia em que além do susto ainda levamos uma bela bronca de papai.

Coisas do gênero eram passíveis de acontecer por lá. Conheci um senhor que era muito bom rezador. Falava-se que ele conhecia uma oração que o fazia controlar o tempo. Sempre quis ver para crer e vi. Uma noite sem lua e sem estrelas, quando se preparava para deixar o armazém com as compras, alguém alertou: “a noite tá escura, cuidado com a sussuarana!” -  a gatinha era vista com frequência pelos que transitavam naquele pedaço de Mata Atlântica. Mas ele não tinha medo. Realmente, o céu fechado de nuvens escuras, preparava uma bela tempestade. Foi até a calçada, tirou o chapéu, como uma reverência, segurou-o junto ao peito, ergueu a cabeça, fechou os olhos e assim e ficou acredito que rezando, por alguns minutos. Depois, colocou a bocapiu nas costas e seguiu viagem. Todos correram para a rua, apenas para confirmar o que já sabiam. O céu estava limpo, nenhuma nuvem manchava aquele manto mágico salpicado de estrelas faiscantes. Como não acreditar? Afinal não era a primeira nem seria a última vez que aquilo aconteceria.

E o pé de graviola? Esse era de arrepiar. Como já falei em outro capítulo, o único banheiro que tínhamos, ficava a uns 20 metros da casa. Nessa ocasião não tínhamos energia elétrica, luz mesmo só de candeeiros, mas necessidades de ir à “casinha” não escolhiam hora e como eu era muito medrosa, à noite nunca ía até lá sozinha. Alguém teria que ficar na porta, vigiando. Há uns cinco ou seis metros à frente, tinha um enorme pé de graviola, cuja fruta não era apreciada a não ser pelos animais, talvez por ignorarmos seus benefícios à saúde. Uma bela noite, por volta das 19h, lá estávamos nós tranquilas, quando algo estranho atraiu a nossa atenção. Uma grande quantidade de areia jorrava sobre a árvore. Parecia chuva. Era tão real, que todas nós ouvíamos o barulho dos grãos sobre as folhas. Chegamos a pensar que fosse alguém querendo nos assustar, mas como a areia caía sem parar, concluímos que era mais que isso. O medo nos paralisou. Correr? Nem pensar. Eu só consegui gritar: Paínhooooooooooooooo!!!!!!  E em segundos, meu protetor, meu herói, estava junto, com espingarda, facão e lanterna em punho. Vasculhou todo o quintal, que por sua vez era cercado e nada encontrou. Enquanto existiu aquela árvore, a areia continuou caindo para quem quisesse ouvir, mas sempre à noite. Nunca descobrimos o mistério do pé de graviola!

E assim eram as coisas, misteriosas e inexplicáveis que só em Ventura podíamos encontrar.

Por Fátima Almeida escrito em agosto de 2015 - Fátima Almeida  airam22_fafa@hotmail.com

Leia também: Mitos Folclóricos e Assombrações :: Por Fátima Almeida

Leia também: Mitos Folclóricos e Assombrações (II) :: Por Fátima Almeida

Notas:

Onça-parda ou sussuarana (Felis concolor)

A Sussuarana é um animal solitário e prefere viver em um lugar de difícil acesso como florestas, desertos e montanhas. Conta-se que uma só sussuarana matou 15 carneiros selvagens durante uma saída para caçar. Por outro lado, ela raramente ataca o homem e tem tanto medo de cães que sobe em árvores para escapar deles quando acuada.

Bocapiu tipo de sacola trançada com palha.


Tenha o Click Sergipe na palma da sua mão! Clique AQUI e confira as últimas notícias publicadas.

WhatsApp

Entre e receba as notícias do dia

Entrar no Canal

Matérias em destaque

Click Sergipe - O mundo num só Click

Apresentação