Américas podem perder certificado de eliminação do sarampo, alerta OPAS
Com baixa adesão vacinal e aumento de registros em países vizinhos, infectologista destaca risco de retorno da doença; Brasil, embora em melhor situação, ainda tem pontos frágeis
O sarampo, por anos considerado controlado nas Américas, volta a preocupar autoridades sanitárias. Após décadas de avanços consistentes, a Região pode perder o status de “livre da circulação endêmica” concedido pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). A soma entre a queda das taxas de vacinação e o crescimento dos casos em países como Estados Unidos, Canadá e México acende um sinal de alerta, especialmente porque o vírus é altamente transmissível e pode se espalhar rapidamente em populações pouco imunizadas.
O aviso marca uma mudança importante no panorama epidemiológico, já que a eliminação da doença no continente havia sido reconhecida pouco mais de dez anos atrás. Com a redução da cobertura, sobretudo entre crianças, a proteção coletiva perde força. Diante dessa conjuntura, manter o esquema vacinal atualizado é crucial para evitar que a transmissão sustentada seja restabelecida, inclusive no Brasil, onde ainda há áreas suscetíveis.
A circulação contínua do vírus em outros países é um fator central de preocupação. Segundo o médico infectologista e professor da Universidade Tiradentes (Unit), Matheus Todt, o alerta da OPAS reflete um cenário real. “Isso ocorre pela manutenção de casos de sarampo, principalmente na América do Norte, e pela baixa cobertura vacinal em todos os países das Américas, inclusive no Brasil”, explica. Dessa forma, até mesmo nações com sistemas de saúde estruturados podem enfrentar surtos se a cobertura ficar abaixo do índice considerado ideal, cerca de 95% do público-alvo com as duas doses.
Quais sinais merecem atenção?
Nos estágios iniciais, o sarampo pode se confundir com outras infecções respiratórias, o que pode retardar a detecção. Os principais sintomas que devem levantar suspeita são:
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Quadro gripal
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Febre
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Erupções cutâneas
Geralmente, o quadro começa com febre alta, tosse e irritação nos olhos, seguido pelo surgimento de manchas avermelhadas pelo corpo. Reconhecer os sinais rapidamente é fundamental, já que a transmissão acontece mesmo antes do aparecimento das lesões. “Ao perceber sintomas compatíveis, é importante buscar atendimento médico e informar se está vacinado, além de contatos recentes e histórico de viagens. Essas informações aceleram a investigação e as medidas de bloqueio”, orienta Todt.
Proteção desigual e riscos persistentes
Embora o Brasil apresente índices melhores de vacinação em comparação a outros países das Américas, o cenário internamente é heterogêneo. Alguns estados e municípios registram quedas expressivas, especialmente após a pandemia, que impactou a rotina dos serviços de saúde. “A proximidade com países onde o vírus circula amplamente, como a Venezuela, somada à queda gradual na procura pelas vacinas, favorece o retorno da doença ao país”, explica.
Regiões de fronteira e grandes cidades exigem maior vigilância porque concentram grande fluxo de viajantes, facilitando a entrada de casos externos. O infectologista reforça que o sarampo pode se espalhar rapidamente em áreas com baixa imunização. A vacina é segura, eficaz e oferecida gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS). “O Programa Nacional de Imunizações (PNI) recomenda duas doses, administradas aos 12 e 15 meses”, detalha.
Além de proteger cada indivíduo, a alta cobertura evita a circulação viral e reduz o risco de quadros graves, especialmente entre grupos vulneráveis, como crianças pequenas, idosos e pessoas imunossuprimidas. “Com cobertura acima de 80%, a probabilidade de reintrodução do sarampo torna-se bastante baixa”, ressalta.
Profissionais da saúde e o avanço da desinformação
Nesse cenário, os profissionais de saúde desempenham papel decisivo. São responsáveis pela identificação precoce de possíveis casos, condução de investigações e orientação da população. A difusão de informações falsas, principalmente pelas redes sociais, tem contribuído para inseguranças sobre a vacinação. Segundo o especialista, esse processo se intensificou no pós-pandemia.
“A pandemia acabou desviando o foco da população e das autoridades de doenças como o sarampo. Além disso, a polarização política e a circulação ampla de dados incorretos, muitas vezes disseminados de forma deliberada, tiveram impacto negativo na adesão às vacinas”, afirma.