O cassino moderno que saqueia as famílias pobres brasileiras :: Por Marcio Rocha
Marcio Rocha*

O avanço desenfreado das apostas esportivas online – as famigeradas bets – representa hoje um dos maiores retrocessos sociais e econômicos enfrentados pelo Brasil no século XXI. Trata-se de um fenômeno que, sob o disfarce de entretenimento ou suposta “oportunidade de lucro”, tem, na prática, devorado a dignidade e o dinheiro das famílias mais pobres do país.
É urgente escancarar a realidade: as bets são verdadeiros cassinos virtuais que se alojaram no bolso de milhões de brasileiros, induzindo jovens, trabalhadores precarizados e beneficiários de programas sociais como o Bolsa Família a jogarem o pouco que têm na esperança ilusória de multiplicar recursos que sequer deveriam estar em risco. A promessa de ganhar dinheiro fácil tem sido vendida com roupagem de “investimento”, mas não passa de uma armadilha cuidadosamente arquitetada para capturar mentes vulneráveis e bolsos já esvaziados.
A situação é tão alarmante que, segundo dados trazidos à audiência pública no Supremo Tribunal Federal (STF), cerca de 50% dos apostadores pertencem às classes D e E. Pessoas que deveriam estar protegidas por políticas públicas estão sendo manipuladas pelo marketing agressivo dessas plataformas, que se infiltram em todos os espaços – do futebol aos aplicativos de celular – promovendo uma cultura de jogo irresponsável, irracional e destrutiva.
Nesse contexto, a atuação da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) se destaca como uma voz responsável e firme. Ao apresentar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a Lei das Bets, a CNC cumpre um papel histórico ao chamar a atenção para os graves impactos que essas práticas estão causando no tecido social brasileiro. A entidade denuncia o que já está visível aos olhos de qualquer observador atento: as bets geram endividamento familiar, desestruturação social, transtornos mentais, e agravam a já delicada crise de saúde pública.
Mais do que um problema econômico, estamos diante de uma crise moral e institucional. A ausência de uma regulação firme por parte do Estado, aliada ao poder financeiro das operadoras de apostas, está permitindo que se consolide no Brasil um modelo onde o lucro de poucos se constrói sobre a ruína de muitos. Uma sociedade que permite que as promessas de sorte substituam o trabalho digno e o investimento real está caminhando para um colapso ético.
Se o STF tem a missão de proteger os valores constitucionais do país, como bem disse o advogado-geral da União, Jorge Messias, ele não pode se omitir diante desse modelo predatório. “As bets não são investimentos. São armadilhas digitais que sequestram o futuro das famílias brasileiras em troca de uma fantasia matemática com chances mínimas de retorno”.
Não há mais tempo para debates superficiais. O Brasil precisa decidir se continuará tolerando que seus cidadãos mais pobres sejam usados como combustível de um mercado bilionário de ilusão – ou se terá a coragem de romper com esse ciclo de exploração digital travestida de diversão.
*Marcio Rocha é jornalista formado pela UNIT, radialista formado pela UFS e economista formado pela Estácio, especialista em jornalismo econômico e empresarial, especialista em Empreendedorismo pela Universitat de Barcelona, MBA em Assessoria Executiva pela Uninter, com experiência de 23 anos na comunicação sergipana, em rádio, impresso, televisão, online e assessoria de imprensa.