Aracaju (SE), 14 de março de 2025
POR: José Lima Santana
Fonte: José Lima Santana
Em: 14/04/2025
Pub.: 14 de março de 2025

Rememorando as Bodas de Ouro de Dom Hélder Câmara

José Lima Santana*

Pe. José Lima Santana - Foto: Arquivo pessoal

Hélder Câmara foi ordenado padre no dia 15 de agosto de 1931, pelas mãos de Dom Manuel da Silva Gomes, arcebispo de Fortaleza, aos 22 anos de idade, com autorização especial da Santa Sé, por não possuir a idade mínima exigida à época. Logo depois de rezar sua primeira Missa, o padre Hélder recebeu a missão de coordenar os Círculos Operários Cristãos e iniciar a Juventude Operária Católica. 

Ainda no Ceará, tornou-se membro da Ação Integralista Brasileira, de Plínio Salgado, como muitos prelados e intelectuais o fizeram, acreditando numa visão nacionalista, que alavancasse o desenvolvimento do Brasil, embora o jovem padre temesse que o Integralismo viesse a ter uma conotação totalitária. 

Em 1936, foi transferido para o Rio de Janeiro, onde, ao lado do cargo de Assistente Técnico em Educação, se dedicou às atividades apostólicas. Ali, o Cardeal Sebastião Leme da Silveira Cintra determinou que não queria padres na política partidária, e, assim, Pe. Hélder deveria encerrar suas atividades na AIB. Já estando desiludido com o movimento, após perceber as implicações ideológicas desta opção, acatou a ordem. Passou a trabalhar numa atividade pastoral voltada para os pobres.

Esta introdução tem o sentido de abrir uma ligeira página e pular para agosto de 1981, ou seja, na celebração das Bodas de Ouro da ordenação presbiteral de Dom Hélder, ocorrida, claro, em Recife. 

De Aracaju, ou seja, da nossa Arquidiocese, fomos o Bispo Auxiliar, Dom Hildebrando Mendes Costa, o padre Raimundo Cruz e este subscritor, então membro da coordenação do Treinamento de Liderança Cristã – TLC, responsável pelas atividades pastorais da juventude na Arquidiocese. 

Dezenas de bispos compareceram às comemorações. Dos arcebispos do Nordeste, pelo que posso lembrar, só faltou Dom Luciano Duarte, que não mantinha boas relações com Dom Hélder. Dos cardeais, só não foi Dom Eugênio Sales do Rio de Janeiro. Os dois citados eram conservadores, enquanto Dom Hélder era progressista. À época, o Clero brasileiro dividia-se basicamente entre conservadores, moderados e progressistas. Mas, foi uma apoteose o que ocorreu no ginásio de esportes conhecido por “Geraldão”. Presentes, dentre tantas autoridades civis, o governador Marco Maciel e o senador Marcos Freire. O primeiro aplaudido, na chegada; e o segundo, aplaudidíssimo. 

O ginásio de esportes, porém, quase veio abaixo quando o locutor anunciou a chegada de Dom Hélder. Que momento! Que ovação, a parecer interminável! A figura miúda do Bispo dos Pobres parecia agigantar-se diante do povo ali reunido. Fora do ginásio, uma multidão ainda maior já o tinha ovacionado, gritado o seu nome, chorando de emoção diante do pastor tão querido. Uma freira que trabalhava com Dom Hélder e que trabalhou também na Paraíba, Dolores, a quem eu ficaria ligado, disse-me que a cerimônia era para ter sido em um dos estádios de futebol da cidade, mas o governo do estado, pressionado pelos militares, aconselhou os organizadores a não fazerem em um estádio, para, assim, impedir uma gigantesca apoteose, que desagradaria os militares, perseguidores de Dom Hélder. 

A saudação a Dom Hélder da parte das denominações protestantes foi feita por um pastor da Holanda, onde o Arcebispo de Recife e Olinda tinha cultivado boas amizades. O orador falava bem a nossa língua. Lembro-me que ele disse, em certo momento: “Dom Hélder não sabe nadar, mas se ele naufragar, com certeza não morrerá afogado. Basta que ele faça um sermão. E de tanto movimentar os braços, acabará nadando”. Referia-se ao modo como Dom Hélder falava, sempre gesticulando. Risos e aplausos.

Em nome do episcopado brasileiro, falou Dom José Maria Pires, Arcebispo de João Pessoa, apelidado de Dom Pelé. Logo no início, ele disse: “Quando eu vim para o Nordeste, fui advertido por alguns irmãos no episcopado, para não me aproximar de Dom Hélder e de Dom Távora, porque, diziam de forma errônea, que eles eram comunistas. Quando eu os conheci, foi deles que eu me aproximei. Com eles, eu aprendi a trabalhar com os pobres, a conhecer as suas agruras e a lutar por eles”. 

Vibrei com a lembrança! Dom José Vicente Távora, amigo/irmão de Dom Hélder. Dois Bispos que engrandeceram o episcopado brasileiro. 

Naquele tempo, as pessoas notavam uma flagrante divisão no perfil dos nossos Bispos: o Arcebispo Dom Távora e o Bispo Auxiliar Dom Luciano. Dois extremos, para alguns. O primeiro era tido como progressista; e o segundo, como conservador, já o disse. Na minha adolescência, eu me voltava para as figuras do Papa João XXII e de Dom Távora. Eram então, na Igreja, os meus ídolos. Mais tarde, eu acrescentei Dom Hélder. Isso eu devo, em parte, ao padre José Araújo Santos, meu diretor no curso ginasial, em Dores, amigo íntimo de Dom Távora, e que, por discordar de Dom Luciano, deixaria o sacerdócio depois que ele ascendeu ao Arcebispado. 

Segundo Araújo, por perseguição de Dom Luciano, ele não conseguiu ser contratado como professor na rede estadual de ensino, após deixar o sacerdócio, mas fora acolhido na rede de ensino da capital, quando, na gestão do prefeito Cleovansóstens Pereira de Aguiar, o secretário de Educação era o prof. Nicodemos Correia Falcão, adventista, que, como administrador estadual da CNEC, nomeara Araújo para dirigir o ginásio cenecista, na minha terra, em abril de 1968. Tornaram-se bons amigos. 

*Padre (Paróquia Santa Dulce dos Pobres – Aruana - Aracaju), advogado, professor da UFS, membro da ASL, da ASLJ, da ASE, da ADL e do IHGSE.


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